terça-feira, 29 de novembro de 2016

corcovados

viemos de tão longe
ver o que ele via,
seus olhos de pedra fixavam
as pupilas no eterno azul
desse horizonte,

ouvi de seus lábios
um murmúrio inaudito,
misto de prece e lamento,
qual o canto de pássaros outrora livres

"tantos fardos esses pregos carregam;
 livre me vi no corpo que ia"

calado, engolindo gritos
como uma caverna
engole ventos,
aqueles olhos lhe sorriam
uma morte vagarosa
um pavor sólido,
esculpindo em seu corpo
o frio dos ferros e das pedras,
suas vísceras domando o inorgânico
afeto da tortura.

Assim nos fez sofrer por sua sina
de trazer o ouro em arcas que se afundam
em distraídos oceanos,
cujo maior valor carrega ao fundo.

Reticente, aos poucos se afasta
dessas esferas de ar e fumo,
nelas se confunde ao contorno
indefinível de sua alma,

ascende em espírito dentre tantos
que lhe façam companhia
nesse inferno terreno,
devotando-lhe estátuas e sonhos.

o giro

mudam as cores
as flores, os ventos,
até os odores;
a grandiosidade de cada dor,

mudam nas correntes invisíveis,
que a despeito de nos prenderem,
indicam caminhos de leveza
e liberdade,

mudam outras correntezas,
dos mares e dos amores,
carregam tristezas e virtudes,
deleites e maldades,

mudam meus olhos
q veem iguais sementes
lançadas em campos diferentes
florescerem ardores semelhantes
e suaves,

mudam todas as intempéries,
que se renovam bons ventos,
árvores, cactos, marés,
veios que se abrem
em desafio à imensidão,

tudo muda e meu coração
também; mas seu sangue será sempre vermelho
de abundância e sofreguidão.

segunda-feira, 28 de novembro de 2016